Por José Marins
Esse “Insistente aprendiz” é o segundo livro de haicais de Nelson Savioli, também saído pela Qualitymark.
No primeiro, “Burajiru Haicais”, os poemas vinham acompanhados da experiência de levar o haicai ao mundo corporativo. Agora a aventura é outra: publicar haicais e contar o gozo de sua criação, ou trazer suas associações com outros poemas, ou revelar fontes da memória do autor em notas que enriquecem a obra.
A promessa feita no início de se buscar um diálogo com o leitor é cumprida de duas formas: o leitor pode realizar a leitura dos poemas e não buscar as notas; ou, num segundo momento, ler os haicais e cada uma das notas correspondentes e ter aí um outro prazer. Na leitura de alguns poemas busquei nas notas mais informações sobre aquele haicai e encontrei outros registros, espécie de ampliação das possibilidades de leitura, noutras o paralelismo interessante.
O autor não está sozinho. Antes Masuda Goga, Teruko Oda e Eunice Arruda fizeram algo parecido em menor escala no livro “Haicai – a poesia do kigo” de 1995. Neste, como dizem os autores: “Os haicais foram compostos sobre os mesmos temas (kigo), e, para melhor percepção por parte dos leitores, foi anexada a cada poema uma explanação (...)”. No livro de Savioli as notas não explicam nem têm finalidade didática, mas associam, abrem janelas para outras visões.
Se, infelizmente, em outros livros há o enxerto teórico pesado, aqui a leveza de alguns achados acrescentam novos significados e nos revelam porque o livro chama-se “insistente aprendiz”.
Outra realização interessante desse livro é o reconhecimento que Nelson Savioli tem para com os colegas. Atitude construtiva essa de anotar em livro as fontes, os colaboradores, os momentos, os “insights” do seu aprendizado.
É gratificante ler mais um novo livro que privilegia o haicai tradicional, que vem assumindo o seu espaço entre os estilos do poema haicai em nossa terra (um país de haicaístas como sonhou o mestre Kyoshi Takahama?)
Escolhi um poema de cada estação para ilustrar esta pequena resenha:
Aqui o poema registra também que se trata de uma vivência do poeta, requisito do feitio do haicai. Podemos ver a borboleta ou um desenho de borboleta nas dobras brancas. Esfregar os olhos ainda mostra alguém sonolento.
Inúmeras são as recriações do haicai da rã de Basho. Este tem uma originalidade nutrida pela observação do poeta, a de que o caranguejo se move em silêncio. Demonstra que é possível buscar o que os antigos buscaram com voz própria.
Bem ao gosto oriental, traz o haimi dos haicais de Issa, Basho. A justaposição dá conta de nos revelar um belo contraste.
O haijin é sempre um self acordado no poeta. O brilho de um caco é captado pela mente alerta. Ser aprendiz de haicaísta será isto, afinal?
A leitura de “Insistente aprendiz” trouxe-me o prazer do haicai compartilhado, a satisfação de ler os poemas de um colega dedicado.
Já estou à espera do próximo livro.
–––––
José Marins, é escritor e haicaísta
http://fieiradehaicais.blogspot.com
No primeiro, “Burajiru Haicais”, os poemas vinham acompanhados da experiência de levar o haicai ao mundo corporativo. Agora a aventura é outra: publicar haicais e contar o gozo de sua criação, ou trazer suas associações com outros poemas, ou revelar fontes da memória do autor em notas que enriquecem a obra.
O poema haicai, tão exíguo, não necessita de explicações. Nelson sabe disso e faz das notas aos haicais sua confissão de aprendiz. Demonstra seu entusiasmo e satisfação com suas vivências haicaísticas. Seu haicai brota da vivência, e, também de uma busca pela leitura dos poetas clássicos e dos estudiosos (também em inglês).
A promessa feita no início de se buscar um diálogo com o leitor é cumprida de duas formas: o leitor pode realizar a leitura dos poemas e não buscar as notas; ou, num segundo momento, ler os haicais e cada uma das notas correspondentes e ter aí um outro prazer. Na leitura de alguns poemas busquei nas notas mais informações sobre aquele haicai e encontrei outros registros, espécie de ampliação das possibilidades de leitura, noutras o paralelismo interessante.
O autor não está sozinho. Antes Masuda Goga, Teruko Oda e Eunice Arruda fizeram algo parecido em menor escala no livro “Haicai – a poesia do kigo” de 1995. Neste, como dizem os autores: “Os haicais foram compostos sobre os mesmos temas (kigo), e, para melhor percepção por parte dos leitores, foi anexada a cada poema uma explanação (...)”. No livro de Savioli as notas não explicam nem têm finalidade didática, mas associam, abrem janelas para outras visões.
Se, infelizmente, em outros livros há o enxerto teórico pesado, aqui a leveza de alguns achados acrescentam novos significados e nos revelam porque o livro chama-se “insistente aprendiz”.
Outra realização interessante desse livro é o reconhecimento que Nelson Savioli tem para com os colegas. Atitude construtiva essa de anotar em livro as fontes, os colaboradores, os momentos, os “insights” do seu aprendizado.
É gratificante ler mais um novo livro que privilegia o haicai tradicional, que vem assumindo o seu espaço entre os estilos do poema haicai em nossa terra (um país de haicaístas como sonhou o mestre Kyoshi Takahama?)
Escolhi um poema de cada estação para ilustrar esta pequena resenha:
Esfrego o olhos.
Uma borboleta branca
sobre o lençol.
Uma borboleta branca
sobre o lençol.
Aqui o poema registra também que se trata de uma vivência do poeta, requisito do feitio do haicai. Podemos ver a borboleta ou um desenho de borboleta nas dobras brancas. Esfregar os olhos ainda mostra alguém sonolento.
No velho mangue –
um caranguejo corre
sem fazer barulho.
um caranguejo corre
sem fazer barulho.
Inúmeras são as recriações do haicai da rã de Basho. Este tem uma originalidade nutrida pela observação do poeta, a de que o caranguejo se move em silêncio. Demonstra que é possível buscar o que os antigos buscaram com voz própria.
Você também, grilo,
admira a beleza desse
arranjo de flores?
admira a beleza desse
arranjo de flores?
Bem ao gosto oriental, traz o haimi dos haicais de Issa, Basho. A justaposição dá conta de nos revelar um belo contraste.
Ainda sonolento –
brilho de um caco de vidro
anuncia a manhã.
brilho de um caco de vidro
anuncia a manhã.
O haijin é sempre um self acordado no poeta. O brilho de um caco é captado pela mente alerta. Ser aprendiz de haicaísta será isto, afinal?
A leitura de “Insistente aprendiz” trouxe-me o prazer do haicai compartilhado, a satisfação de ler os poemas de um colega dedicado.
Já estou à espera do próximo livro.
–––––
José Marins, é escritor e haicaísta
http://fieiradehaicais.blogspot.com
O livro pode ser adquirido através do site da Quality Mark ou nas livrarias (a pedido).
Genial!!! No mínimo...
ResponderExcluirCaro José Marins:
ResponderExcluirÉ isto: o comentário tem de ser certeiro e enxuto como o haiku ele mesmo! foi o que o meu amigo fez com o estimável e didáctico livro do nosso companheiro de letras Nelson Savioli.
E uma questão: porque é que se fala tanto de aprendizado quando se escreve sobre haiku? Talvez porque o haiku é mais uma consequência de um processo que é mais amplo que a poesia.
Um abraço do
David Rodrigues
Lisboa, Portugal.
Querido José Marins:
ResponderExcluirQue maravilha, começar a semana com este seu belo presente!
Insistente Aprendiz
no viver cada instante
- Eterno,colore o mundo.
Amei-os!
ATR
Belo Horizonte
- Brasil
crítica séria a esse livro, sem coorporativismos, fez o felicíssimo.
ResponderExcluiragradeço à raimara mas quero dizer que o texto do Marins tb é sério.
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